o aumento em outubro e novembro de casos de Covid-19 na cidade de São Paulo e sua letalidade

Euler Sandeville
Bruna Feliciano Palma
(nov. 2020)

Depois de dois meses de diminuição constante no número de casos novos de infecção por coronavírus, ao final de outubro a tendência de queda foi revertida com um aumento de 137% para os casos notificados a cada duas semanas epidemiológicas e de 67% para os óbitos. Entre 10 e 24 de outubro haviam sido registrados 9.020 novos casos na cidade de São Paulo; entre 07 e 21 de novembro, foram registrados 21.381 novos casos; o número de óbitos a cada duas semanas epidemiológicas aumentou no mesmo período de 271 para 454.

O grave crescimento de casos do COVID-19 a partir de outubro pode ser revertido, mas isso demanda uma mudança de atitude solidária e responsável e o apoio correto das orientações governamentais, sendo uma mudança necessária a adoção de estratégias territoriais que considerem as diferentes dinâmicas espaciais no enfrentamento da pandemia nos grandes centros, a qual já foi apontada por outros estudos, mas que não foi considerada nem a nível municipal, estadual ou federal.

Este tipo de política demandaria a compreensão das formas de dispersão do Covid-19 na cidade e de como afeta diferentes extratos da população, de modo a tornar essas informações efetivas para a ação em escalas intraurbanas e localizadas, a passo daquelas definidas por dados totais de leitos ocupados e ocorrências, o que é tanto mais relevante, pois esse novo aumento substancial nos casos registrados está ligado a aspectos do estresse e desgaste na longa situação de exceção e insegurança imposta pela pandemia, por aspectos comportamentais e por uma fragilidade negacionista na conscientização dos problemas em curso.

Segundo os dados totais até novembro para a cidade de São Paulo, disponibilizados pela Fundação SEADE (consulta em 26/11), mais mulheres são infectadas, mas a mortalidade (letalidade de 3,4% e 5,0% respectivamente) é maior entre homens. Há uma porcentagem maior de Brancos contaminados (53,3%) e mortos (58,8%), mas a letalidade é bem superior entre Pretos (Brancos 4,6%, pardos 3,5%, Pretos 6,1%). De longe, as doenças preexistentes, no caso de morte, são Cardiopatias (53,0%) e Diabetes (36,4%) seguidas de doenças neurológicas (11,2%). No entanto as letalidades mais elevadas são no caso de doenças neurológicas (53%), pneumopatias (45,8%) e doenças hepáticas (53%). Chama atenção que não são disponibilizados nessas estatísticas dados socioeconômicos, que seriam de fundamental importância para a análise da pandemia, obrigando a estabelecer correlações a partir de dados na escala de distritos, permitindo um refinamento insuficiente dos efeitos na cidade, que deveriam orientar ações locais.

A maior faixa de contágio está abaixo dos 50 anos e acima dos 30 (44,8% dos casos registrados); no entanto, os casos registrados abaixo de 40 anos somam 47,5%, onde a subnotificação pode ser maior, pois jovens muitas vezes demonstram menos sintomas. Se considerarmos a faixa entre 20 e 59 anos, temos 76,2% dos casos registrados. Os casos registrados abaixo de 50 anos equivalem a 68,4% dos casos, portanto, quase 70% dos casos registrados atingiram pessoas nessa idade. Ao contrário, a mortalidade concentra-se em pessoas com mais de 60 anos, onde, inversamente, concentram-se os mortos na cidade em decorrência da pandemia (77,8% das pessoas que morreram na cidade da doença tinham mais de 60 anos).

Da mesma forma, é nessa faixa acima dos 60 anos que a letalidade da doença é expressivamente maior. Para as pessoas que contraem a doença acima de 80 anos, a letalidade atualmente é de 36%, entre 70 e 79 de 22,3%, e entre 60 e 69 anos morreram 10,4% das pessoas que contraíram a doença nessa faixa de idade. Isso quer dizer que as mortes acima de 90 anos correspondem a 8,4% das pessoas que morreram da doença na cidade, por ser uma faixa etária com um contingente menor de pessoas, mas a letalidade das pessoas que contraíram a doença nessa faixa etária foi de 36%. A letalidade decai substancialmente abaixo dos 60 anos (3,5% na faixa de 50 a 59 anos e 1,2% na faixa de 40 a 49 anos), sendo que abaixo de 40 anos começa a ser bem inferior a 1%. Embora a letalidade seja menor, a dor da perda das famílias de modo algum o é, com a interrupção brusca da vida em uma faixa etária que apenas começa a descobrir sua potencialidade.

Esses dados não são meras quantidades que dizem respeito apenas à idade das pessoas ou seu risco à ação do vírus. Mostram também as consequências das práticas sociais e dos valores que orientam o comportamento das pessoas. Vem sendo considerado que a diminuição dos cuidados preventivos e de distanciamento social, uma vez que apenas uma pequena parcela pode permanecer no isolamento social, é maior em grupos mais jovens, o que encontra apoio dos dados disponíveis. Isso agrava a condição de dispersão e os efeitos da pandemia, porque a maior quantidade de pessoas contaminadas com casos registrados, como vimos, é jovem, faixas etárias em que a subnotificação tende a ser maior. Uma análise da configuração territorial da pandemia neste momento parece confirmar essas condições.


Euler Sandeville Jr. é Professor, Arquiteto e Urbanista, Arte educador, Pós-Graduação em Ecologia, Mestrado, Doutorado e Livre Docência pela USP, gestor e pesquisador do Instituto da Paisagem

Bruna Feliciano de Palma é Estudante de Geografia, pesquisadora do Instituto da Paisagem.


como citar

SANDEVILLE JR., Euler, PALMA, Bruna Feliciano. A distribuição espacial dos casos de Covid-19 em setembro, outubro e novembro na cidade de São Paulo. São Paulo: Instituto da Paisagem Projeto Biosphera21, Ensino e Pesquisa (https://ensinoepesquisa.net.br/), on line, 2020 [nov].


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Foto Euler Sandeville, Folha, detalhe, 2009.
Folha, detalhe. Foto de Euler Sandeville, 2009.

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