a Terra é azul… que mundo é esse? parte 4: nossos novos ícones e nossa nova percepção do mundo

A TERRA AZUL [1] … QUE MUNDO É ESSE?
Parte 4. nossos novos ícones e nossa nova percepção do mundo
Euler Sandeville Jr.
versão inicial 2005/jan 2010/ 21/02/2016 a 05/03/2016. Última atualização: 05/03/2016


cite este artigo
SANDEVILLE JR., Euler. “A Terra azul…Que mundo é esse? 4: nossos novos ícones e nossa nova percepção do mundo”. Ensino e Pesquisa: A Natureza e o Tempo (o Mundo), on line, São Paulo, 2016.


As ameaças da década de 1970, do sistema internacional bipolar, e no Brasil o terror da ditadura e a luta armada, cederam a novos ícones. Inicialmente, esses ícones foram-nos oferecidos como a destruição do muro de Berlim em 1989 e o “esfacelamento” da URSS em 1991. Entre 1989 e 1992 [19], esses fatos emblemáticos alardeavam um “mundo novo”, surgido sobre as ruínas da Guerra Fria. Não deu certo, esse novo mundo.

A União Soviética não existe mais, declarou em 1991 James Baker, secretário de Estado dos EUA. Também não havia mais o Muro de Berlim, de 155 km de extensão, 3,60 metros de altura, dimensões e formas de controle que hoje seriam discretas diante de câmeras, drones, mapeamento contínuo até de dados biomédicos, preferências decorativas de si (e o self), amizades etc. e localização/mobilidade dos cidadãos nas grandes cidades. O Muro nos chocava pela brutalidade, pelo terror emudecedor que se nos oferecia como uma forma de educador invisível. Começara com uma cerca armada em 1961, mesmo ano da tentativa norte-americana de invasão de Cuba, um dos ícones da Guerra Fria.

O mundo evidentemente mudara nas décadas entre 1980 e 1990, todos reconheciam, mas não encontravam prontamente as formas suficientes de um novo posicionamento. Logo, todos os discursos procurariam adaptar-se, reinterpretar e reinterpretar-se para reinserirem-se no que parecia uma nova ordem de coisas.

Estação Espacial MIR1, lançada em 1986, ano também da explosão do ônibus espacial Challenger. Na foto: “12 June 1998 Russia’s Mir space station is backdropped over the blue and white planet Earth in this medium range photograph recorded during the final fly-around of the members of the fleet of NASA’s shuttles. Seven crew members, including Andrew S.W. Thomas, were aboard the Space Shuttle Discovery when the photo was taken; and two of his former cosmonaut crewmates remained aboard Mir. Thomas ended up spending 141 days in space on this journey, including time aboard Space Shuttles Endeavour and Discovery, which transported him to and from Mir. Fonte spaceflight.nasa.gov/gallery/images/shuttle/sts-91/hires/91727051.jpg e (spaceflight.nasa.gov/gallery/images/shuttle/sts-91/html/91727051.html) Original image: NASA/Crew of STS-91 This image or video was catalogued by one of the centers of the United States National Aeronautics and Space Administration (NASA) under Photo ID: STS091-727-051. This tag does not indicate the copyright status of the attached work. ”
Disponível em spaceflight.nasa.gov/gallery/images/shuttle/sts-91/hires/91727051.jpg acesso em 27/02/2016.
“1984, Micrografia eletrônica de varredura de VIH-1, em cor verde, saindo de um linfócito cultivado. Microfotografía con MEB de VIH-1 en liberación (en verde) en un cultivo de linfocitos. Esta imagen ha sido coloreada para resaltar las características importantes; para la imagen original en blanco y negro véase PHIL 1197. Las múltiples protuberancias redondeadas sobre la superficie celular representa los sitios de ensamblado y gemación de viriones. Photo Credit: C. Goldsmith Content Providers: CDC/ C. Goldsmith, P. Feorino, E. L. Palmer, W. R. McManus – This media comes from the Centers for Disease Control and Prevention’s Public Health Image Library (PHIL), with identification number #10000. Note: Not all PHIL images are public domain; be sure to check copyright status and credit authors and content providers.” Disponível em pt.wikipedia.org/wiki/V%C3%ADrus_da_imunodefici%C3%AAncia_humana#/media/File:HIV-budding-Color.jpg Acesso em 27/02/2016.
Em brasustribunaldosbichos.blogspot.com.br/2012/07/pais-inicia-producao-de-animais.html acesso em 27/02/2016, post de 2012, ficamos sabendo que os primeiros animais transgênicos foram camundongos produzidos em 1981:
“Desde então, o genoma do camundongo já foi completamente sequenciado e praticamente todos os seus genes – 95% dos quais são iguais aos do homem – já foram modificados de uma forma ou de outra (…) Só o Laboratório Jackson, um dos maiores fornecedores de camundongos transgênicos do mundo, nos EUA, tem um catálogo com mais de 6 mil variedades e vendeu, só no ano passado, mais de 3 milhões de animais para pesquisadores de 56 países”. No Brasil o primeiro foi produzido em 2000, na USP. O Laboratório de Modificação do Genoma (LMG), do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, em Campinas (“Se um cientista precisa de um animal transgênico, ele faz a encomenda, fornece as especificações, o LMG produz o animal e manda para ele. Tal qual um escritório de engenharia executa um projeto para um arquiteto”), já produziu cerca de 50 linhagens de camundongos transgênicos, utilizando nove genes diferentes: “Outras 15 linhagens foram importadas do Laboratório Jackson, por US$ 6,5 mil (cerca de US$ 230 por animal). O Estado presenciou a chegada das últimas quatro, no início do mês: oito camundongos em uma caixa de plástico com comida e água em forma de gel. São animais com um grau a mais de complexidade transgênica. Eles têm uma enzima no organismo que funciona como um interruptor molecular, que permite aos cientistas ligar ou desligar as modificações genéticas onde e quando desejarem.”.
Na imagem acima, um uso menos cinetífico. “GloFish”, variedade do peixe Danio rerio geneticamente modificada com adição de um gene do cnidário Aequorea victoria. No sítio da empresa lemos: “GloFish® fluorescent fish are born brilliant! They are not injected or dyed. They inherit their harmless, lifelong color from their parents, and require the same care as any other community fish. GloFish are great for any home, office, or classroom and perfect for hobbyists and beginners alike. GloFish are available in six striking colors: Red, Blue, Green, Purple, Orange, Pink.” Source glofish.com/images/glofish_005.jpg The copyright holder of this file allows anyone to use it for any purpose, provided that the copyright holder is properly attributed. Redistribution, derivative work, commercial use, and all other use is permitted.
Disponível em commons.wikimedia.org/wiki/File:GloFish.jpg acesso em 27/02/2016.

No cotidiano a nossa percepção do mundo também era imensamente impactada. Em 1995 o acesso à World Wide Web (“criada” em 1991) foi possibilitado a partir do estabelecimento dos provedores. Os telefones celulares, introduzidos em 1990 no Brasil, quando havia 667 linhas, chegam a 1.416.500 linhas em 1995. Coisa ainda irrelevante, se considerarmos o boom de aparelhos a partir de 1999 (15.032.698 linhas), atingindo no início de 2004 mais de 47 milhões de linhas e logo depois a cifra impensável (e irreal) de quase “um celular para cada brasileiro” (175,6 milhões de celulares em janeiro de 2010 segundo a Anatel).

Todas essas transformações acima indicadas, e outras igualmente relevantes, quase já não nos permitem lembrar – tão absorvidos e conectados que estamos -, do mundo no qual, até há pouco, muitos de nós viveram. O modo de viver muda, não são apenas hábitos e novos artefatos. São profundas mudanças comportamentais nas expectativas, anseios e medos, nas possibilidades e valores de satisfação, e o que não se percebe tão facilmente, na ética e na própria natureza. Trata-se de um novo mundo, por vezes intratável.

Havia uma outra face, subjacente à euforia anunciada com a queda da Cortina e do Muro, que se mostraria logo no início da primeira década do século 21. Não mais entre bancas de jornais e revistas que coloriam o imaginário dos anos 1960 na canção de Caetano Veloso (Alegria Alegria, de 1967, apresentada no Festival da Record desse ano), mas em um mundo conectado 24 horas por dia. Quem não abre o programa de imeil (e-mail) ao chegar em casa? Aliás, informação já antiquada, os e-mails e redes sociais vibram aos nossos passos, enquanto conversamos, nas reuniões, ao redor da noite. Esta outra face da nossa alardeada “Nova Era” é ainda violenta, mas vem carregada de ambiguidade, emergência, indiferença, como observei em um texto de 2002:

O signo de esperança e liberdade da queda do muro de Berlim em 1989 revela sua face crua, dura, abominável, na ‘primeira guerra do século’, como está sendo chamada. Mudaram-se os jogos e condições, o modo de fazer guerra? Não interessa, aos ataques seguem-se orações, doação de comida e mortes. A polarização Nova Iorque – Cabul põe a descoberto os valores a partir dos quais estamos construindo o planeta para nossos filhos!

A mesma tecnologia que nos permite colocar, neste momento, este trabalho on line disponível ao mundo todo, ou transmitir em “tempo real” uma reunião a qualquer parte do planeta, ou realizá-la em rede entre vários países em “tempo real”, é extensão cotidiana de novas formas de controle, circulação de informação… e morte. A vida, tornada por todos os meios questão de mercado, por isso também de estratégia, é disputada palmo a palmo nos fóruns entre as nações, como nas esquinas das cidades, nos pregões, gabinetes públicos, sindicatos e escritórios.

Essa face sombria da “Nova Era” anunciada – não tão nova como logo se viu, evidenciou-se com o atentado às “torres gêmeas” de Nova Iorque (em 2001), com as subsequentes novas formas de ações estadunidenses no Oriente Médio, e hoje com atentados, refugiados e crimes transmitidos ao vivo on line. [20]

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notas
1 Atualização parcial do texto base do memorial apresentado na Livre Docência em 2010, elaborado a partir de reelaboração crítica de texto de 2005.

19 Em âmbito nacional, o ano de 1984 foi um marco quando a praça passou a ser novamente pública em toda sua extensão, e os estudantes correndo da polícia e se reagrupando aqui e ali da década anterior foram substituídos nas áreas centrais urbanas pelo comício-show-cívico e pela eleição livre para presidente (este, triste memória) em 1989.

20 SANDEVILLE JR., Euler. Memorial para um, ano novo e para um novo milênio. São Paulo: Revista Brasil, 2002b.


como citar material desta página:
SANDEVILLE JR., Euler. “A Terra azul…Que mundo é esse? 4: nossos novos ícones e nossa nova percepção do mundo”. Ensino e Pesquisa: A Natureza e o Tempo (o Mundo), on line, São Paulo, 2016.

[para citar este artigo conforme normas acadêmicas, copie e cole a referência acima (atualize dia, mês, ano da visita ao sítio)]


espiral da sensibilidade e do conhecimento
uma proposta de euler sandeville

 

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