UNIVERSIDADE LIVRE E COLABORATIVA EM PERUS: UMA EXPERIÊNCIA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DE APRENDIZAGEM COLABORATIVA
Euler Sandeville Jr., Gabriel de Andrade Fernandes, Regina Célia Soares Bortoto
a origem do programa
O programa Universidade Livre e Colaborativa iniciou-se em 2011, a partir do encontro do Núcleo de Estudos da Paisagem (NEP) do LABCIDADE (FAU USP) com lideranças sociais, artistas e professores no bairro de Perus, em especial a Comunidade Cultural Quilombaque e o coletivo de educação Coruja, gerando atividades experimentais didático-pedagógicas, de enfrentamentos e busca de soluções de questões urbanas e sociais na região. Tanto o NEP, quanto os grupos parceiros em Perus, vinham de um acúmulo de experiências anteriores de articulação entre universidade e comunidade, o que permitiu gerar um programa de trabalho novo, de uma abrangência maior do que fora possível até então, denominado Universidade Livre e Colaborativa.
Figura 1: Programa Universidade Livre e Colaborativa, NEP USP / Quilombaque / Coruja. Aula integrada graduação, pós-graduação, moradores, março de 2013.
A região dos trabalhos na fase atual é prioritariamente definida pelos Distritos de Perus, Anhanguera, Subprefeitura de Perus, e ainda pelo Distrito de Jaraguá, Subprefeitura de Pirituba, no setor noroeste do município de São Paulo, SP. Aspectos importantes, tanto no âmbito local quanto no regional, devem rapidamente ser destacados nessa área, embora seja impossível neste trabalho apresentá-los além da menção a seguir. Seu significado local e para a metrópole paulistana, ao lado das histórias de vida que constroem no tempo essas paisagens, é absolutamente estruturador do trabalho em curso, quais sejam: o conjunto ambiental e cultural1 formado pelos parques Jaraguá, Cantareira, Anhanguera, pela Fábrica de Cimento Portland de Perus, Ferrovia Perus-Pirapora, Sindicato Queixada, Aldeia Guarani no Parque Jaraguá, Estação de Trem Perus, Cemitério Dom Bosco, conectados pela bacia do ribeirão Perus desde o Juqueri até ao Pinheirinho d’Água e outros parques previstos ou existentes nas bacias do Perus e Cabuçu de Baixo, além das áreas de recuperação ambiental das pedreiras e do aterro Bandeirantes, as antigas cavas de ouro na região do Jaraguá e Morro Doce, entre outros elementos de conectividade ambiental, devendo-se fazer gestão para sua articulação com o Parque do Juqueri e seu conjunto histórico e paisagístico.
Os estudos já realizados mostraram a importância do complexo de paisagem representado por toda área de mineração e produção, pela Fábrica de Cimento Perus, pela estrada de ferro Perus- Pirapora e pela área de mineração em Caieiras, bem como do complexo em torno do Jaraguá, incluindo o Parque, as cavas de mineração do final do século XVI e início do XVII e as aldeias guaranis, em Terra Indígena demarcada pela FUNAI desde 2013, homologada somente em 2015, sujeitando os índios a uma série de conflitos fundiários, como em outras regiões do país. Esses dois pontos, Jaraguá e Perus, permitiram, por ação dos trabalhos da Universidade Livre e Colaborativa, a criação do Território de Interesse da Cultura e da Paisagem Jaraguá Perus2.
Pela complexidade dos processos desencadeados, a experiência será restrita prioritariamente ao território do município, mas deverão (conforme intenção original que estava na criação do NEP em 2002/2003), no futuro, serem incluídos municípios vizinhos, em especial definindo uma área referenciada pelas reservas da Cantareira, Juqueri e Jaraguá, articulando um rico patrimônio cultural e natural, de grande importância para o desenvolvimento local e da cidade.
a natureza do programa
A experiência aqui descrita constitui-se como uma ação dialógica, não isenta de conflitos, envolvendo protagonistas e interlocutores ligados à universidade, ao universo técnico-profissional, à comunidade de moradores e educadores da região, entre outros. Neste sentido, trata-se de uma experiência de construção partilhada de conhecimento sobre a cidade e de problematização do desenvolvimento local, em vários sentidos pioneira. Considera-se, nesse diálogo e confronto de saberes e experiências, a história da região e sua conformação natural, a memória viva de seus moradores, suas práticas culturais e lutas, a articulação entre questões locais e regionais, estudando, portanto, as questões urbanas, culturais e ecológicas implicadas em suas diversas escalas.
Figura 2: Programa Universidade Livre e Colaborativa, NEP USP / Quilombaque / Coruja. Aula integrada graduação, pós-graduação, moradores: Oficina de planejamento, março de 2013.
A Universidade Livre e Colaborativa é um programa em processo de “aprendizagem em ação”3, valorizando saberes e fazeres locais e considerando-os no ambiente social mais amplo em que se constituem, buscando a construção de um conhecimento crítico, sensível e potencialmente transformador.
Portanto, um objetivo a ser atingido é a própria experiência da ação, independente de seus resultados, ou seja, os erros e acertos, os equívocos e as contingências, os entraves e as vicissitudes do processo constituem momentos significantes e criativos do processo de aprendizagem e construção de conhecimentos. Neste sentido, trata-se ainda de buscar a experiência de algo cuja metodologia não é tomada como uma modelagem da ação, mas como um rico e crítico processo de descoberta e conflito, cujas características constituem igualmente um objetivo didático a ser alcançado por seus participantes.
Seja enquanto experiência (condição existencial) e enquanto experimento (no nosso caso, um processo de indagação aberto enquanto se constrói), este conjunto de ações na região de Perus busca fortalecer e valorizar os objetivos e as metas mais amplas partilhados entre os atores locais e o NEP, possibilitando situações de troca ricamente potencializadoras de novas ações.
Segundo Jorge Larrosa (2002: 27–29):
Este é o saber da experiência: o que se adquire no modo como alguém vai respondendo ao que vai lhe acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece. No saber da experiência não se trata da verdade do que são as coisas, mas do sentido ou do sem-sentido do que nos acontece. […]
Uma vez vencido e abandonado o saber da experiência e uma vez separado o conhecimento da existência humana, temos uma situação paradoxal. Uma enorme inflação de conhecimentos objetivos, uma enorme abundância de artefatos técnicos e uma enorme pobreza dessas formas de conhecimento que atuavam na vida humana, nela inserindo-se e transformando-a. A vida humana se fez pobre e necessitada, e o conhecimento moderno já não é o saber ativo que alimentava, iluminava e guiava a existência dos homens, mas algo que flutua no ar, estéril e desligado dessa vida em que já não pode encarnar-se.
Figura 3: Programa Universidade Livre e Colaborativa, NEP USP / Quilombaque / Coruja. Aula integrada graduação, pós-graduação, moradores: atividade em casa de participantes, maio de 2015.
Para além dos protocolos acadêmicos rígidos, para além dos argumentos de autoridade, para além da autoridade de argumentos descolados da vivência e da cooperação, busca-se construir uma cultura que produza conhecimento de modo partilhado. Popper4 distingue na construção do conhecimento entre argumentos de autoridade, autoritários e silenciadores à medida que não permitem ou intimidam o questionamento, e a autoridade dos argumentos, que para ele deveria ser lógica, decorrente da possibilidade contínua de refutação. Porém, ressalta-se: a “autoridade dos argumentos”, quando se baseia apenas na noção de excelência, arrisca a alienar-se do campo ético e sensível, do seu sentido na construção solidária da experiência humana.
Não se trata de reservar à autoridade um inescapável campo negativo que sua associação com formas autoritárias quase impõe, colocando-a em oposição cabal à liberdade, mas de qualificar seu sentido e extensão, e de reconhecer uma tensão fundante nas práticas. Mesmo camuflada, é evidente nos processos de educação e construção de conhecimentos, bem como de contestação ou imposição social. Paulo Freire ocupa-se bastante da tensão implícita entre liberdade e autoridade5, e tende a considerar que “é no domínio da decisão, da avaliação, da liberdade, da ruptura, da opção, que se instaura a necessidade da ética e se impõe a responsabilidade”6. Portanto, não quer dizer que não haja processos de decisão inclusive baseados em responsabilidades diferentes entre os participantes. Ao contrário, significa que esses processos são geridos coletivamente em cada programa do projeto, sempre respeitando a proposição mais abrangente, procurando formas de cooperação entre vários saberes para a construção de novos saberes sobre a realidade em que nos inserimos e as razões e possibilidades de sua transformação.
Cabe ressaltar, o fato de a comunidade de educadores e artistas de Perus, há tempo virem promovendo ações de desenvolvimento local. Trata-se de uma demanda acolhida pelo NEP como um dos objetivos deste conjunto de ações. Os estudos realizados em diversas outras regiões da cidade, por vezes mais precarizadas, mostram inequivocamente a importância da geração de renda, embora, se desvinculada de um processo de construção de conhecimentos e de aprendizagem no sentido humanista, limitaria muito o seu alcance podendo até chegar à anulação de sua razão. Ou seja, a renda é necessária, mas não se trata só de renda, e sim de uma construção longa, ética e criativa, na superação de imensas e complexas desigualdades históricas. Neste sentido, no contexto específico de Perus, a ideia de desenvolvimento, bem como sua problematização crítica e aplicabilidade, são questões a serem alcançadas neste conjunto de ações.
princípios e fundamentos
Os princípios adotados pela Universidade Livre e Colaborativa são baseados na Espiral da Sensibilidade e do Conhecimento (proposta pelo professor Euler Sandeville e que deu origem ao NEP) e na proposição da Firmeza Permanente, que fundamentou a luta histórica dos Queixadas na região pela construção de direitos, inspirada nos princípios da não-violência de Gandi, Martin Luther King e outros. Há muitos pontos de convergência entre as duas proposições, ainda que a primeira privilegie uma ação poética e um conhecimento em ação, e a segunda uma ação de resistência trabalhista e política, ambas adotam firmemente a questão da transformação por fins, e, portanto, por meios, pacifistas e humanistas.
Quadro 1: Princípios da Espiral da Sensibilidade e do Conhecimento e do NEP. Disponível em http://nep.arq.br/
Esses princípios são assumidos como base deste projeto e alimentam os acordos de gestão das atividades em sua duração. Conceitualmente, a Universidade Livre e Colaborativa parte do entendimento da paisagem como uma experiência partilhada, definindo também aspectos metodológicos e de aprendizagem em ação, bem como da educação como uma construção colaborativa de saberes.
A Espiral da Sensibilidade e do Conhecimento é um projeto poético, não-disciplinar, elaborado a partir de 2002. O conhecimento e o aprendizado são entendidos como uma construção partilhada de saberes e práticas. O projeto decorre de um longo caminhar errante apreendendo e em aprendizagem, permitindo propor o conhecimento como poesia por outros meios, e perceber a vida como ação estética, conhecimento poético e afetivo, compromisso social e aprendizado existencial com o outro. Arte. A Espiral é colaborativamente mover nossos conhecimentos sobre as dinâmicas ecológicas, urbanas e socioculturais, ao lado de potencialidades afetivas e poéticas, reconstruindo-os conjuntamente com parceiros a partir de processos experimentais, sensíveis e cognitivos de entendimento e transformação. Para tanto, na perspectiva de uma educação-pesquisa-aprendizado em ação, experimental e existencial (arte), são desenvolvidos em grupos de estudo e de pesquisa e de aprendizagem em ação.7
Cinco pontos definem a estratégia de ação da Espiral: criatividade (sensibilização), investigação (construção), participação (integração solidária), compromisso social (ação efetiva), alegria e afetividade (vivência estética e ética). Não seria possível desenvolver esses postulados aqui, mas convém dar um exemplo. A ênfase na alegria e na afetividade, bem como de toda experiência como uma vivência ética estética, contribui para que o processo educativo seja buscado não com base em um sistema de conteúdos-avaliação, mas entendido como uma experiência e partilha criativa e afetiva, levando o grupo a considerar como parte de processos de aprendizagem o deambular, a conversa, a refeição, e daí nossas aulas em igrejas, moradias, praças e tantos outros lugares menos habituais. Essa valorização do vivido, da experiência na paisagem, da consideração às afeições e ao coletivo é da maior importância nessa busca.
A expressão “Firmeza Permanente” tem um ideário fortemente de ação política direta, constante e pacifista. Segundo Mário Carvalho de Jesus, advogado formado sob influência do grupo Economia e Humanismo francês e da Juventude Católica (JUC e JOC), os Queixadas (movimento sindical nascido na Fábrica de Cimento Perus, do qual Jesus veio a ser advogado nos principais anos de ação do Sindicato) adotaram gradualmente, a partir de meados dos anos 1950, formas de reação e construção de direitos decorrentes de “princípios do Evangelho e do “Princípios para Ação” do Padre Lebret, do grupo Economia e Humanismo”: “Éramos decididamente pacificadores e firmes nas atitudes”. Esses princípios foram identificados por Jean e Hikdegard Goss, em visita a Perus em 1962, como os da não-violência. Esclarece Mario de Jesus que:
“Historicamente a não-violência renasceu com Gandhi, que se valeu dela para conseguir a independência da Índia; nos Estados Unidos o objetivo da não-violência era combater a discriminação racial, tendo Luther king como mártir; no Brasil, na América Latina, o objetivo inicial é pedir a aplicação de leis que estão em consonância com a declaração Universal dos Direitos do Homem”.8
No entanto, a não-violência parecia-lhes uma expressão pobre9 para ações que exigiam muita coragem. Jean Goss acrescentou então a expressão “não-violência-ativa”. Então, desde 1973 os Queixadas passaram a se referir a suas práticas de ação direta pacifista e não violenta, com as inspirações acima indicadas, e em situações de intenso confronto pela construção de direitos que gradualmente ultrapassaram a questão trabalhista, por “firmeza permanente”. Importante destacar que o movimento não se restringiu aos aspectos do trabalho, mas avançou por pautas como direito das mulheres, meio ambiente, educação e cultura, ainda que a partir do ambiente do trabalho. Isso contribuiu na região, ao lado das Comunidades Eclesiais de Base, já nas décadas seguintes, para a formação de lideranças voltadas para questões da educação, saúde e urbanas, fortemente alicerçadas em princípios éticos e ativos.
Figura 4: Programa Universidade Livre e Colaborativa, NEP USP / Quilombaque / Coruja. Aula integrada graduação, pós-graduação, moradores: atividade e almoço-aula, maio de 2015.
Figura 5: Programa Universidade Livre e Colaborativa, NEP USP / Quilombaque / Coruja. Aula integrada graduação, pós-graduação, moradores: aula no espaço público, maio de 2015.
Como fundamentos conceituais que alimentam os trabalhos, cabe destacar o entendimento da paisagem, já mencionado, enquanto condição de ser no mundo, articulando esferas da subjetividade, do simbólico, da sociabilidade no cotidiano, e dos tempos na qual a paisagem é herança e um patrimônio coletivo que transcende, mas também é futuro que vai se definindo com nossas ações, sendo todos coautores de seu destino10. As paisagens são entendidas, então, como um campo de tensões e contradições, evidenciando o drama humano que abrigam em sua dimensão histórica, ecológica e cultural, e as implicações sociais e ambientais que se abrem com esses estudos. Estes são convergentes com os princípios acima, na medida em que essa concepção da paisagem, e também do território, indica métodos de trabalho dialógicos11, que neste projeto, devem ser fundados na relação humana colaborativa e participante na construção de conhecimentos.
pautas específicas
Assim, até o presente momento, a Universidade Livre e Colaborativa é a construção do conhecimento sem hierarquia entre os saberes decorrentes de titulações acadêmicas, valorizando o aprendizado, enquanto alargamento de horizontes, de forma criativa, apontando para imensas possibilidades de contribuir para uma transformação. Nesse sentido, a seguir, sem ordem de prioridade, com exceção talvez do primeiro item que corresponde à luta histórica na região e que partilhamos integralmente, se faz necessário indicar as pautas prioritárias adotadas no início da construção deste projeto, a partir da região Perus/Anhanguera, e que acabam norteando as ações desencadeadas, muitas vezes, envolvendo outros parceiros:
1) proteção, restauração e uso público da Fábrica de Cimentos Portland Perus, a implantação do “Corredor Cultural” em seus “três eixos” de desenvolvimento, Fábrica, Ferrovia Perus-Pirapora e Parque Anhanguera, defendidos desde o Fórum de Perus, além do Centro de Cultura e Memória do Trabalhador, previsto pelo movimento dos Queixadas, e do espaço de gestão comunitária e da Universidade Livre e Colaborativa;
2) elaboração de um plano participativo de proteção ambiental integrado com equipamentos de educação, saúde, lazer e procurando possibilidades de geração de renda;
3) estímulo e apoio ao desenvolvimento de incubadoras locais nesses temas, sobretudo por jovens e no formato de gestão autônoma e coletiva;
4) desenvolvimento de uma estratégia inovadora de gestão pública local baseada na integração e na participação direta e na capacitação de moradores, administração pública e demais órgãos descentralizados;
5) atenção a uma noção de desenvolvimento fundada em uma perspectiva humanista que valorize as potencialidades de crescimento intelectual, sensível, solidário, sobretudo a partir da educação e cultura, da saúde e do ambiente e da capacitação dos diversos estratos da população para ações baseadas nessas perspectivas;
6) desenvolvimento de material de apoio didático e dinâmicas sobre a história de Perus e programas de curta duração de formação na área de cultura, meio ambiente e cidade;
7) compreensão e interferência crítica e construtiva nos processos de desenvolvimento e gestão urbana, na transformação das paisagens e no desenvolvimento humano e cultural baseado na fruição cognitiva e sensível, solidária e afetiva da cidade, visando a transformação de seus valores e práticas;
8) contribuição para ampliar o acesso ao sentido e conteúdo de instituições culturais em outros locais da cidade em projetos educativos visando ampliar estratégias para potencializar uma irradiação cultural e educativa em Perus;
9) contribuição para a valorização da memória e da história vivida pela população, de seu conhecimento e para a reflexão sobre o sentido dessas experiências na construção da cidade.
Em função dos processos realizados, essa pauta deve ser ampliada com mais três pontos:
10) priorização a projetos de parceria com as escolas públicas no escopo e princípios assumidos pela Universidade Livre e Colaborativa;
11) homologação da Terra Indígena do Jaraguá, melhoria da qualidade de vida respeitando os valores e práticas guaranis decididos por processos próprios da comunidade, reconhecimento de sua importância e valorização de seu potencial cultural e educativo para a cidade;
12) colaboração na implantação do Território de Interesse da Cultura e da Paisagem Jaraguá Perus, aprovado no Plano Diretor em 2014, reconhecendo a herança de lutas na região e seu patrimônio, em grande medida decorrente dos esforços da Universidade Livre e Colaborativa na criação desse novo instrumento de gestão para o planejamento urbano.
Importante destacar que, quando pensada, a ênfase na questão local e regional não visou, em nenhum momento, constituir nem exacerbar formas de localismo primário, mas de diálogo e de ampliação da experiência no conjunto de possibilidades da cidade e da cultura. Deve-se observar ainda que essa pauta é complexa, dinâmica e não pode ser alcançada toda ao mesmo tempo nem por um grupo apenas, exige uma duração longa, envolvendo cooperação. Os itens indicados não são apenas uma meta a se atingir ou para contribuir com sua viabilização, mas uma experiência continuada. Neste sentido, vale reforçar que as atividades propostas pela Universidade Livre e Colaborativa são desenvolvidas em uma perspectiva transdisciplinar e poética, ultrapassando as fronteiras das fragmentações disciplinares dos campos científicos (mas com elas dialogando), não porque não sejam válidas, mas porque são explorados outros caminhos cognitivos.
como nos organizamos
Inicialmente, houve a atuação na discussão e proposição de alternativas participativas mais adequadas social e ambientalmente para o Parque Linear Perus, em 201112. Nesse percurso formou-se, desde 2011, um coletivo que sustentou a organização do projeto, articulando-se em ações específicas com outros parceiros, decorrente de um envolvimento do trabalho, de modo que ainda permanece em construção. Participam ou participaram um conjunto de pessoas de diferentes níveis de formação escolar, de modo que o trabalho não é demarcado por qualquer hierarquia meritocrática ou administrativa, mas pela comunhão a certos princípios fundantes e práticas dialógicas de construção.
São direcionadas em um programa de trabalho na região, pesquisadores do NEP, de graduação, pós-graduação, iniciação científica e pré-iniciação científica, bem como o disciplinas colaborativas, a exemplo do que já havia sido realizado como experiência de articulação de pesquisas na região sul de mananciais, na Brasilândia, Heliópolis e Atibaia13,
Entre 2012 e 2014, semestralmente, foram oferecidas disciplinas de graduação e pós-graduação, com oficinas abertas à comunidade, ministradas em Perus e organizadas conjuntamente de modo colaborativo e horizontal, inclusive no seu programa de ensino. Este foi o principal mote do projeto até o final do ano passado, gerando uma rica experiência e o modo, em grande medida, como o trabalho passou a ser visto, embora houvesse simultaneamente outras frentes. Momentaneamente, essa estratégia foi suspensa, visando construir a consolidação e implementação dos conhecimentos decorrentes, em especial através de parcerias com escolas públicas e com coletivos e movimentos locais visando a implementação do Território de Interessa da Cultura e da Paisagem Jaraguá Perus concebido nesse processo e aprovado no Plano Diretor Estratégico da Cidade.
O sucesso dessa experiência de disciplinas merece um relato mais detido, aqui serão apenas indicadas. Buscam romper, em primeiro lugar, com a cisão entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão na academia: entende-se que a construção do conhecimento, função primordial da universidade, cresce e se fortalece à medida que se articulam as diferentes frentes de ação de tal instituição, aproveitando-se das potencialidades criadas em cada frente e respeitando suas especificidades. Parece-nos antes de tudo contraditório a busca pelo conhecimento estabelecer protocolos sobre o que deve e o que não deve ser considerado “ensino”, “pesquisa” ou “extensão”14 isoladamente — além disso, a separação em três frentes costuma atribuir exclusivamente à pesquisa a tarefa de produzir conhecimento, relegando ao ensino e à extensão a mera “transmissão” de algo produzido algures. Em segundo lugar, é pioneira (embora não inédita), pois rompe com as tradicionais pretensas separações entre o espaço do “pensamento” (localizado no interior dos muros da universidade, em salas de aula isoladas) e o espaço da “coleta” de informações ou da execução de “experimentos” (aquilo que costuma ser chamado de “trabalho de campo”). Esta experiência se revela, de fato, uma proposta de produção de conhecimento acadêmico e aprendizagem colaborativa e transformadora de parte a parte, como costumamos dizer: além de aprender sobre a cidade, também aprender na e com a cidade.
A cada disciplina oferecida, por vezes envolvendo mais de quarenta integrantes, no que tange àquela disciplina, constitui-se um novo círculo de gestão, de modo que todas as decisões são tomadas coletivamente no processo de realização da disciplina. Um número muito grande de alunos de graduação, pós-graduação e moradores participou nesses três anos dos trabalhos, inclusive alguns passando a integrar os processos de construção a partir de 2015.
As formas possíveis de inserção são variadas, de modo a facilitar a participação dos interessados, independente de sua formação: graduandos inscrevem-se em disciplina de seu nível, assim como pós-graduandos. Profissionais externos podem se inscrever na forma de “aluno especial” em ambos os casos e aqueles que não possuem diploma e/ou não estejam interessados em matricular-se formalmente como aluno especial podem se inscrever na “Oficina da Cidade” que, na prática, não se distingue das outras atividades. Esta formatação propiciou rica interação e rica situação de diálogo e colaboração de saberes e memórias.
As três instâncias citadas (disciplina de graduação, de pós-graduação e oficina) são desenvolvidas juntas, sem distinção entre o grau de escolaridade dos participantes, normalmente aos sábados. As aulas ocorrem em diferentes locais da Subprefeitura de Perus. Para isso, em cada caso, são desenvolvidos processos de trabalho em que se produza uma leitura coletiva da realidade e dos projetos e planos previstos para a região. A experiência de aprendizado em ação – coletiva, sensível, dialógica e crítica – tem assim se verificado, com um retorno sempre muito grande de todos os participantes. A composição dos coletivos interessados em participar desta experiência tem se revelado intensamente variada — algo que foi celebrado desde o início pelos seus organizadores e pelo próprio coletivo. Os resultados dessas frentes contribuíram para subsidiar movimentos sociais locais e desencadear outra frente de trabalho, com as escolas públicas, além, como dito anteriormente, de intervenções que direcionaram vários aspectos regionais e mesmo municipais da gestão urbana e da legislação urbanística.
in/conclusão
Os objetivos traçados aqui, portanto, constituem o foco de uma ação poética e política (portanto, sujeita ao risco e às contingências do cotidiano), sensível e crítica. O afeto, o lúdico, o prosaico, o não programado, o não protocolar, o amoroso, a tensão e o medo, a amizade e o estranhamento, entre outros elementos daquilo que na vida costuma estar distante da academia — ainda que em nada desafiem o necessário rigor acadêmico — são componentes não só do processo, mas também dos objetivos a serem alcançados. Os objetivos e procedimentos, bem como a própria ideia em construção, não são tidos como reificações distantes alienadas do processo, mas como processos de aprendizagem abertos. A perspectiva muda à medida que o processo flui, adapta-se às necessidades surgidas a cada novo encontro. Deste modo, não são rígidos, mas fluidos.
como citar material desta página:
SANDEVILLE JÚNIOR, Euler; FERNANDES, Gabriel de Andrade; BORTOTO, Regina Célia Soares. Universidade livre e colaborativa em Perus: uma experiência didático-pedagógica de aprendizagem colaborativa. In: Arquitectura y calidad socioambiental en ciudades del Cono Sur=Arquitetura e qualidade socioambiental nas cidades do Cone Sul[S.l: s.n.]. Organização: Luis Muller e Maria Lucia Refinetti Martins. (Org.). São Paulo; Buenos Aires: FAU USP (Brasil) e FADU UNL (Argentina), 2016, v. , p. 135-147. Núcleo de Estudos da Paisagem, on line, São Paulo, 201X. Disponível em http://nep.arq.br/2018/02/26/universidade-livre-e-colaborativa-em-perus-uma-experiencia-didatico-pedagogica-de-aprendizagem-colaborativa/ acesso em DIA/MÊS/ANO.
[para citar este artigo conforme normas acadêmicas, copie e cole a referência acima (atualize dia, mês, ano da visita ao sítio)]
Obs. pode haver pequenas diferenças entre o material publicado aqui e o material final da publicação, e há diferenças nas imagens. Clique aqui para uma versão em pdf próxima da publicada.
núcleo de estudos da paisagem
a natureza e o tempo (o mundo)
uma proposta de euler sandeville
modelo de como citar outro material deste sítio
REFERÊNCIAS DA PÁGINA
RESUMO O artigo objetiva promover uma reflexão sobre o processo de construção do conhecimento no contexto do ensino de arquitetura e urbanismo — bem como sobre a relação entre universidade e sociedade — a partir da apresentação do conjunto de ações e parcerias promovidas pelo Núcleo de Estudos da Paisagem (NEP) do Laboratório do Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade) com moradores, professores e lideranças na região de Perus, extremo noroeste do Município de São Paulo. Trata-se de um conjunto de iniciativas que reúnem em um mesmo contexto atividades de ensino, pesquisa e extensão, nas quais buscam-se romper as tradicionais fronteiras universitárias entre estes três campos, assim como entre disciplinas e abordagens metodológicas diversas, e entre os mais variados grupos sociais internos e externos à universidade. Este conjunto de iniciativas se deu no contexto do encontro entre o NEP e seus vários parceiros em Perus (grupos de educadores, organizações locais, movimentos populares, entre outros), o qual deu origem ao programa que ficou conhecido como Universidade Livre e Colaborativa. A partir destas experiências, o artigo argumenta pela necessária construção afetiva, lúdica e responsável do conhecimento, por meio do diálogo constante, ultrapassando dicotomias usuais entre saber popular e erudito e entre trabalho de gabinete e de campo.
Palavras-chave: Dialogicidade, Aprendizagem Colaborativa, Universidade Livre e Colaborativa.
sobre os autores
Euler Sandeville Jr. (Professor Livre-Docente da Universidade de São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental do IEE USP, Arquiteto e Urbanista, Arte-Educador, pós-graduação em Ecologia, coordenador do Lab Cidade, FAU USP)
Gabriel de Andrade Fernandes (Arquiteto e Urbanista, Mestrando da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Especialista em laboratório no Centro de Preservação Cultural da USP)
Regina Célia Soares Bortoto (diretora aposentada da rede pública de Ensino Municipal de São Paulo, Pedagoga, membro do coletivo de formação Coruja, membro do GT de Educação da Universidade Livre e Colaborativa e membro da Rede Paulista de Educação Patrimonial)
referências citadas
ARANTES, A.A. O que é cultura popular. São Paulo, Brasiliense, 1982, 3ª ed.
BERQUE, Augustin. El pensamiento paisajero. Trad Maysi Veuthey, ed Javier Maderuelo. Madrid: Biblioteca Nueva, 2009 La tierra, por su proprio movimiento, p35-47 e Aun teniendo sustancia, tiende al espíritu p 81-94
BESSE, Jean-Marc. Petrarca na montanha: os tormentos da alma deslocada. Em Ver a Terra. Seis ensaios sobre a paisagem e a geografia. Trad.: Vladimir Bartalini. São Paulo: Perspectiva 2006.
CAUQUELIN, Anne – A Invenção da Paisagem. São Paulo: Martins Fontes, 2007
CHAUÍ, Marilena. Política cultural, cultura política e patrimônio cultural. In O Direito à memória. Patrimônio histórico e cidadania. São Paulo: DPH, 1992, p. 37-56
CICAS. A cultura em lutas pela paz. São Paulo: CICAS, SMC, 2011.
CLARK. Kenneth. Paisagem na arte. Trad.: Rijo de Almeida. Lisboa: Editora Ulisseia, 1961 [1949]
COSGROVE, Denis E. A geografia está em toda a parte: cultura e simbolismo nas paisagens humanas [1989]. Tradução Olivia Lima da Silva. In CORRÊA, Roberto Lobato, ROSENDAHL, Zeny (org.). Paisagem, tempo e cultura. Rio de Janeiro: UERJ, 2004, 2 ed., p. 92-122
DUNCAN, James S. O supra-orgânico na geografia cultural americana [1980]. In CORREA, Roberto Lobato e ROSENDAHL, Zeny (org.). Introdução à geografia cultural. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p 63-102.
FREIRE, Paulo. [1971] Extensão ou comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
FREIRE, Paulo. [1968] Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
FREIRE, Paulo. [1996] Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2010.
GEERTZ, Clifford. Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa da cultura. In A interpretação das culturas [1973]. Rio de Janeiro: LTC, 2008
HUMBOLDT, Alexander von. Quadros da natureza. Tradução Assis de Carvalho. São Paulo: W. M. Jackson Inc., 1950, 2 vol.
JESUS, Mário Carvalho de. Cimento perus. 40 anos de ação sindical transformam velha fábrica em centro de cultura municipal. São Paulo, JMJ, 1992
LA BLACHE. Paul Vidal de. Os pays da França (1904). In Vidal, Vidais. Textos de geografia humana, regional e politica. Org. Guilherme Ribeiro, Rogério Haesbaert, Sergio Nunes Pereira. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura, um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 2006
LAROSSA BONDÍA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, n. 19, 2002, pp. 20–28.
LLOSA, Mario Vargas. Breve discurso sobre a cultura. In Dicta & Contradicta, Instituto de Formação e Cultura, n. 06, dez 2010, p.12-22
MENEZES, Ulpiano Bezerra de. A paisagem como fato cultural. in YÁZIGI, Eduardo (org). Turismo e Paisagem. São Paulo: Contexto, 2002, pg. 65 a 82
PINTO, João Breno. A descoberta da não-violência. In JESUS, Mário Carvalho de. Cimento Perus. 40 anos de ação sindical transformam velha fábrica em centro de cultura municipal. São Paulo, JMJ, 1992 (1977, em A Força da Não-Violência – A Firmeza Permanente).
POPPER, Karl R. Conjecturas e refutações. Trad.: Benedita Bettencourt. Coimbra: Almedina, 2003 [1962, 3 ed. 1968]
ROGER, Alain. La naissance du paysage en Ocident. In SALGUEIRO, Heliana Angotti. Paisagem e arte: a invenção da natureza, a evolução do olhar. São paulo: I Colóquio Internacional de História da Arte, 2000, PG. 33-39.
SAUER, Carl O.. A morfologia da paisagem [1925]. In CORREA, Roberto Lobato e ROSENDAHL, Zeny (org.). Paisagem, tempo e cultura. Rio de Janeiro: Ed UERJ, 2004, p 12-74.
SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. Tradução Hildegard Feist. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
referências citadas dos autores
SANDEVILLE JR., Euler. Paisagens e métodos. Algumas contribuições para elaboração de roteiros de estudo da paisagem intra-urbana. Paisagens em Debate, FAU.USP, v. 2, p. 1, 2004.
SANDEVILLE JR., Euler. Paisagem. São Paulo: Paisagem e Ambiente n. 20, 2005, pg. 47-59.
SANDEVILLE JR., Euler. Manifesto Espiral. São Paulo: Cidade Sem Nome n. 6, 2008. Disponível em http://nep.arq.br/2017/12/17/manifesto-espiral-2008/ acesso em 26/02/2018.
SANDEVILLE JR., Euler. Paisagens vivenciadas, educação-pesquisa-aprendizado em ação. Anais do 10 ENEPEA – Encontro Nacional de Ensino de Paisagismo em Escolas de Arquitetura. Porto Alegre: PUCRS, 2010.
SANDEVILLE JR., Euler. Paisagens partilhadas. São Paulo: Faculdade de Arqwuitetura e urbanismo, Livre Docência, 2011.
SANDEVILLE JR., Euler. Paisagens partilhadas. São Paulo: Paisagem e Ambiente, 30 (2012), p. 205-214
SANDEVILLE JR., Euler. Aprendizagem em ação: Por pedagogias participantes e criativas na paisagem e no ambiente. Por um cotidiano criativo. São Paulo: Espiral da Sensibilidade e do Conhecimento, disponível em espiral.fau.usp.br, acesso junho de 2013.
SANDEVILLE JR., Euler; ANGILELI, Cecilia Maria de Morais Machado . Quando a Casa Vira Parque. In: XV ENAMPUR, 2013, Recife. Anais do XV ENAMPUR, 2013.
SANDEVILLE JR., Euler; MANFRÉ, Eliane. Cultura e Paisagem, uma nova perspectiva no tecido urbano. São Paulo: Observatório das Metrópoles, 2014. Disponível em Núcleo de Estudos da Paisagem, on line, São Paulo, 2014, http://nep.arq.br/2018/02/05/cultura-e-paisagem-uma-nova-perspectiva-no-tecido-urbano/ acesso em 26/02/2018.
_____________________________
notas
1 O termo “cultura” é polissêmico, e daí talvez sua sedução. Neste trabalho, priorizamos o sentido antropológico e social, do conjunto de valores e práticas vivenciadas no convívio social e no tempo, para mencionar resumidamente (GERTZ 2008; ARANTES, 1982; LARAIA 2006). Mas outras significações, indicadas pelo contexto ocorrem, o reconhecimento social enquanto patrimônio ou o do setor cultural (LLOSA, 2010; CHAUÍ, 1992, CICAS 2011), como no emprego que abre esta nota, mas sempre mantendo a perspectiva mais ampla indicada.
2 Para mais informações sobre os Territórios remetemos a SANDEVILLE JR. e MANFRÉ, 2014
3 SANDEVILLE JR., 2010, 2013.
4 POPPER, 2003.
5 FREIRE 2010:104.
6 FREIRE 2010:18.
7 SANDEVILLE JR., 2008.
8 JESUS, 1992.
9 PINTO, 1992.
10 Trato dessa problematização da paisagem em um conjunto grande de trabalhos, como SANDEVILLE JR. 2004, 2005, 2011, 2012. Recomendo fortemente o trabalho de Ulpiano Bezerra de Menezes (2002). Na geografia há uma longa tradição de conceituação e crítica da paisagem, que remonta a autores do início do século passado como La Blache (2012) e Sauer (2004), ainda que frequentemente os estudos remontem aos trabalhos fundamentais de Alexander von Humboldt (1950), passando por uma crítica radical e embates a partir de meados do século envolvendo autores como Cosgrove (2004) e Duncan (2003), até uma retomada a partir de cerca dos anos 1980, com autores como Berque (2009), Besse (2006), Alain Roger (2000) entre outros. Nas artes e nos estudos da cultura, desde o clássico de 1949 de Kenneth Clark (1961) até o monumental Paisagem e Memória de Simon Schama (1996) ou os estudos de Cauquelin (2207), entre muitos outros. Não se pode esquecer a criação de uma chancela Paisagem Cultural, recentemente, no âmbito da preservação. Assuntos extensos, que só a enumeração de autores ultrapassaria um artigo. Interessa aqui que, reconhecendo a importância da visualidade, em todos esses autores se verifica que problematizam a paisagem para além do campo da visualidade estrita.
11 FREIRE, 2002, 2005, 2010
12 SANDEVILLE JR., 2013.
13 Desde 1990 Sandeville Jr. tem publicado diversos artigos relatando algumas dessas experiências e problematizando essa relação da Universidade com a sociedade e a cidade, com uma revisão até a Livre Docência (2011). Podem ser encontrados em http://nep.arq.br/publicacoes//.
14 Particularmente, recusamos pensar nossas práticas como extensão, ainda que nos relatórios acadêmicos tenhamos de incluí-las nessa chave. Para entender melhor essa posição, partilhamos e remetemos às considerações de Paulo Freire em “Extensão ou Comunicação” (2002).